No último texto postado neste blog, comentávamos o contraste e a interação entre os âmbitos da Teoria e da Metodologia. Enquanto a Metodologia relaciona-se aos fazeres de um determinado campo disciplinar, a Teoria relaciona-se aos modos de ver, às concepções que pautam este mesmo campo disciplinar. Entre alguns aspectos que remetem à Teoria, podem ser dados como exemplos os "conceitos" utilizados, e também os Paradigmas.
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É sobre o conceito de Paradigma que discorreremos neste momento.
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Um Paradigma, nas ciências, corresponde a determinadas concepções e modos de entender um certo campo de conhecimento que são partilhados pelos praticantes deste campo de conhecimento. A palavra "paradigma", etimologicamente falando, remete à idéia de um modelo a ser seguido.
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As diversas ciências sempre apresentaram, no decorrer do seu desenvolvimento, certos paradigmas que puderam ser partilhados pelos praticantes de cada campo de conhecimento em questão. Por exemplo, desde fins do século XVII e até fins do século XIX,a Física e outros campos das ciências exatas foram amplamente dominados pelo paradigma newtoniano, um modelo que foi instituído por Isaac Newton (1643-1727). Durante a maior parte deste período, praticamente todos os estudiosos de Física concordavam com os preceitos e concepções fundamentais introduzidos por Newton na pesquisa e análise dos fenômenos estudados pela Física. Em fins do século XIX, esse paradigma já não conseguia explicar ou se aplicar ao estudo de alguns dos novos objetos de estudo que surgiram na Física - como certos fenômenos astrofísicos ou como o mundo das partículas atômicas - e por isso esse paradigma começou a ser confrontado por outros, tais como o paradigma da Física Quântica ou como o paradigma da Relatividade, proposto por Albert Einstein. Este é um exemplo bem interessante de que, por vezes, um determinado paradigma se presta muito bem à análise de certos problemas, mas pode começar a apresentar dificuldades para o estudo de outros fenômenos ou âmbitos de estudo. Quando os pesquisadores de um campo de saber começam a fazer novas perguntas, de certa maneira começam a enxergar as coisas de modo diferente - isto é, começam a desenvolver um novo olhar teórico. Frequentemente surgem nestas situações novos paradigmas (novas maneiras de conceber um determinado campo de conhecimentos).
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As Ciências Sociais e Humanas possuem uma peculiaridade que,de certo modo,contrasta com as Ciências Exatas e Naturais. Dificilmente existe um único paradigma, ou um paradigma amplamente dominante, emdisciplinas como a História, a Sociologia, a Antropologia, a Geografia, a Psicologia, entre outras. Habitualmente os campos de saber relacionáveis às ciências humanas são habitados por um determinado número de paradigmas que são disponibilizados aos seus praticantes. Pode-se dizer que estas ciências são multiparadigmáticas.
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Na História, por exemplo, começam a despontar alguns paradigmas já desde o momento em que que surgiu, no século XIX, a proposta de uma historiografia científica (isto é, no momento em que a História conquista seu assento entre as disciplinas universitárias e no qual surge a figura do historiador profissional).
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Já na primeira metade do século XIX começam a se confrontar dois paradigmas que oferecem aos historiadores duas maneiras distintas de conceber a História: o Positivismo e o Historicismo. Em meados do século XIX, já surge um terceiroparadigma: o Materialismo Histórico. Isto apenas para citar as três principais concepções entre as quais se dividiram os historiadores neste primeiro século da historiografia científica.
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É importante também ressaltar que um historiador não precisa necessariamente se identificar integralmente comum paradigma. Há historiadores cujo trabalho parece dialogar comaspectos de um e de outro paradigma, e outros que ficam a meio caminho entre um paradigma e outro. Entender os modelos básicos que são disponibilizados à comunidade dos historiadores não significa acreditar nem que esses modelos existam apenas na sua forma pura, e nem que os historiadores precisem todos se agrupar da mesma maneira, e integralmente, no interior de um único paradigma. Um paradigma historiográfico é uma referência teórica maior que passa a ser partilhada por um número significativo de historiadores, ou pelo menos um modelo que serve de base para um diálogo.
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Existe uma certa discussão a cerca da possibilidade de utilizarmos ou não o conceito de paradigma para compreendermos as alternativas teóricas que se desenvolvem no interior de uma ciência social ou de uma ciência humana. Eu particularmente acredito que este conceito seja bastante útil, desde que tenhamos sempre em vista que as ciências sociais e humanas são sempre multiparadigmáticas. Possivelmente, nunca existirá consenso entre todos os historiadores acerca de um único paradigma que deveria orientar o desenvolvimento dos trabalhos historiográficos. Dito de outra forma, os historiadores sempre contarão com a possibilidade de fazerem certas escolhas teóricas e metodológicas, sem que se possa dizer que uma ou outra é mais correta ou mais adequada.
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Para profundar a questão do "Uso do Conceito de Paragima nas Ciências Humanas", remeto a um artigo que publiquei recentemente comeste mesmo título:
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"Sobre a noção de Paradigma e seu uso nas ciências humanas" (Cadernos de Pesquisa Interdisciplinar em Ciências Humanas, UFSC, 2010)
http://www.periodicos.ufsc.br/index.php/cadernosdepesquisa/article/view/12516/12858
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http://www.scribd.com/doc/39224610/Sobre-a-nocao-de-Paradigma-e-seu-uso-nas-Ciencias-Humanas-BARROS-Jose-D-Assuncao
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